Colunista Adérito Mendes (Água-Tendências): Para além do equilíbrio financeiro – o grande desígnio
Sobre tendências no domínio da água, ocorre-me mencionar aquilo que mais preocupa as empresas e os serviços municipais e municipalizados que é o equilíbrio financeiro da prestação de serviços. Já vimos que nas redes urbanas e seus equipamentos a era da renovação já começou, mas que não basta substituir o velho pelo novo.
São necessárias novas soluções e tecnologias que a inovação pode ajudar bastante.
Embora na óptica de quem vende serviços da água tarifados em volume, ou seja, o universo empresarial e municipal, possa parecer uma ameaça a redução do consumo de água, que induz a redução de afluência de águas residuais e de energia no transporte e tratamento, e a reutilização, que vistas na perspectiva estática podem representar redução de volume de negócio, vão ser um estímulo e oportunidade para a diversificação das soluções na prestação de serviços e para a sustentabilidade financeira das empresas e serviços municipais ou municipalizados.
Aproveitando a inércia positiva da onda da economia circular em formação, os prestadores dos serviços em águas podem e devem empreender iniciativas inovadoras que vão no sentido de diversificar e aumentar a segurança desses serviços, não apenas para defenderem o seu volume de negócio mas também como um imperativo ambiental e de sustentabilidade.
Entre muitas e diversificadas apostas indica-se a título de exemplo a recuperação das águas pluviais das áreas impermeabilizadas e seu armazenamento em reservatórios enterrados nos pisos de garagens e caves ou no exterior dos edificios sob os passeios ou jardins, para usos menos exigentes como os autoclismos, rega de plantas e lavagens de pisos.
Outro exemplo pode ser a recuperação de recursos para fertilizantes, reduzindo a carga poluente das redes de drenagem e das estações de tratamento, através da instalação de sanitas separadoras de urina e fezes (já disponíveis e fabricadas em Portugal) e armazenando-as em condições que possibilitem a sua compostagem e substituindo os adubos químicos industriais com elevada componente de importação. Na fase actual da tecnologia disponível esta solução ainda não é aplicável em edifícios com mais de dois ou três pisos.
No domínio da pecuária a obrigatoriedade de compostagem e/ou produção de biogás permitiria reduzir muito a carga poluente nas redes de drenagem agrícola e a energia comprada das explorações.
As vias para a concretização da economia circular são amplas e diversificadas com o aliciante de serem motivadoras dos jovens empreendedores pela característica de serem soluções inovadoras.
Nesta matéria a intervenção regulatória tem um papel importante que pode ser pro-activo ou reactivo.
Adérito Mendes, engenheiro civil do ramo de hidráulica, formado em 1976 pelo Instituto Superior Técnico, é pós-graduado em “Alta Direcção em Administração Pública” e especialista em “Hidráulica e Recursos Hídricos”. Foi Coordenador Nacional do Plano Nacional da Água – 1998/2002 e 2009/2011 e autor de dezenas de estudos, projectos e pareceres relacionados com recursos hídricos. Começou a carreira como técnico superior na Direcção Geral dos Recursos e Aproveitamentos Hidráulicos, em 1977, passou pela Direcção Geral dos Recursos Naturais. Além de profissional liberal na área de estudos, projectos e obras hidráulicas, foi Director de Serviços de Planeamento do Instituto da Água-1988-2011, assessor de serviços de Comissão Directiva do POVT-QREN e assessor da presidência da Agência Portuguesa do Ambiente. Exerceu ainda as funções de docente do Instituto Superior de Engenharia de Lisboa-2002-2014.