Colunista Adérito Mendes (Água-Tendências): Poupar energia ou amortizar investimentos?

Colunista Adérito Mendes (Água-Tendências): Poupar energia ou amortizar investimentos?

Os sistemas hidráulicos que materializam o ciclo urbano da água são de elevada intensidade energética, quer no transporte quer no tratamento, tanto nas águas de abastecimentos como nas águas residuais. Basta imaginar a quantidade de estações de bombagem que tudo isso comporta.

Com o aumento crescente dos custos de produção de energia eléctrica esta passou a ser uma das principais componentes dos custos dos serviços do ciclo urbano da água.

É do conhecimento geral dos que acompanham as matérias energéticas que a hierarquia de custos de produção de energia eléctrica estão directamente associados às fontes primárias de energia e que crescem do carvão à fotovoltaica, tendo pelo meio a hídrica, nuclear, eólica, gás, biogás e petróleo. Está demonstrado que quanto mais limpa/ecológica é a produção de energia eléctrica mais cara esta é.

Tendo como referência este facto, em termos puramente económicos, ainda me espanto com afirmações noticiosas que simplesmente asseguram que os investimentos em sistemas solares em grandes instalações ou consumidores de energia eléctrica permitem reduzir os custos energéticos quando comparados com uma boa negociação com grandes produtores de energia eléctrica que assentam a produção num mix de fontes primárias.

Todos os que aprendem gestão de projectos e de processos aprendem a demonstrar que “não há almoços grátis”. Em economia, como ciência de redistribuição de bens escassos, dêem as voltas que derem não há milagres, dum lado estão os custos e do outro os benefícios e se há investimentos tem de haver amortizações. Quando os custos são maiores os benefícios também têm de ser para haver equilíbrio. Se os benefícios de um investimento de maiores custos são os mesmos que os de um investimento de custos mais baixos alguém terá de pagar a fundo perdido a diferença de custos para que ambos sejam considerados concorrentes. É o que se passa com os investimentos em soluções energéticas ecológicas/limpas do ciclo urbano da água.

Portanto, a autoprodução de energia por biogás ou solar num sistema do ciclo urbano da água financiado parcialmente a fundo perdido que poupa custos energéticos, em termos económicos, quanto muito, amortiza os custos desse fundo perdido.

A opção por energia limpa/ecológica não é uma questão técnica ou económica mas antes uma questão de natureza política que o planeta agradece. Ou seja, enquanto os grandes poluidores mundiais não suportarem os custos proporcionalmente ao que poluem, cada sociedade pode optar por canalizar os seus recursos económicos na aposta ecológica por razões que não são de natureza técnica nem económica, mas por razões de filosofia de vida, que em termos gerais compete ser definida e aplicada pelos dirigentes políticos e governamentais.

Estamos no domínio da substituição de umas coisas por outras, ou seja, se gastarmos mais na produção de energia com elevados benefícios ambientais menos podemos investir noutras soluções também necessária ao que consideramos qualidade de vida. Do meu ponto de vista essa deve ser a opção que promove a sustentabilidade ambiental global.

Todavia, do ponto de vista da empresa deixar de comprar energia à rede pública é poupar em relação à situação anterior, mas do ponto de vista global essa condição corresponde a custos suportados pela economia.

Adérito Mendes, engenheiro civil do ramo de hidráulica, formado em 1976 pelo Instituto Superior Técnico, é pós-graduado em “Alta Direcção em Administração Pública” e especialista em “Hidráulica e Recursos Hídricos”. Foi Coordenador Nacional do Plano Nacional da Água – 1998/2002 e 2009/2011 e autor de dezenas de estudos, projectos e pareceres relacionados com recursos hídricos. Começou a carreira como técnico superior na Direcção Geral dos Recursos e Aproveitamentos Hidráulicos, em 1977, passou pela Direcção Geral dos Recursos Naturais. Além de profissional liberal na área de estudos, projectos e obras hidráulicas, foi Director de Serviços de Planeamento do Instituto da Água-1988-2011, assessor de serviços de Comissão Directiva do POVT-QREN e assessor da presidência da Agência Portuguesa do Ambiente. Exerceu ainda as funções de docente do Instituto Superior de Engenharia de Lisboa-2002-2014.

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