
Colunista António Sá da Costa (Energia-Renováveis): Não é produção eólica que faz aumentar o preço
Quando me preparava para escrever este artigo caiu na minha caixa de correio eletrónico o artigo do Miguel Prado publicado no Expresso eletrónico a 3 de outubro, que refere que o preço médio da eletricidade no MIBEL verificado em setembro de 2018 era o 4º mais elevado desde que havia MIBEL, tendo atingido o valor de 71.3 €/MWh. Os outros três meses, e de acordo com o referido artigo, foram novembro de 2008 com 76.5 €/MWh, outubro de 2008 com 76.4 €/MWh e janeiro de 2017 com 71.5 €/MWh.
Os preços elevados do ano de 2008 encontram uma justificação no facto de em julho desse ano se ter verificado o máximo histórico do preço do barril de petróleo que quase atingiu 150 USD, mas outro fator comum a três destes quatro meses é a reduzida contribuição de eletricidade de origem eólica, que oscilou entre 10.2% e 13.5%. A exceção a esta observação foi o mês de janeiro de 2017, mas todos certamente se recordam que nesse mês houve uma procura de eletricidade muito elevada na Europa devido á paragem forçada, por questões de verificação e de reforço das regras de segurança, de bastantes centrais nucleares em França o que levou a que os preços nesse mês disparassem.
Chamo a atenção para o facto da baixa penetração de eletricidade eólica faz aumentar os preços da eletricidade em mercado pela simples razão de que é substituída por eletricidade produzida em centrais a gás natural, portanto mais caro. Se pretendemos ter estabilidade e previsibilidade nos preços da eletricidade temos de abandonar a ideia que toda a eletricidade tem de ofertar no mercado spot diário. A maior parte da eletricidade de origem renovável pode, e deverá passar, a ofertar em processos concorrenciais de maior longo prazo que o dia pois, só com concursos públicos de longo prazo, 10 ou 15 anos, é que se poderá garantir a tal previsibilidade e baixa de preços que a economia exige.
Há muito que defendo esta opção para Portugal, mas até há data sem nenhuns resultados, apesar de por essa Europa se usarem metodologias semelhantes à que defendo. Não vou explicar o que fazer neste artigo, mas não querer perceber que estamos a ir pelo caminho errado é o mesmo que “tapar o Sol com uma peneira”, na verdadeira aceção da frase pois, podíamos implementar este tipo de concursos competitivos agora que se pretende aumentar em Portugal a produção de eletricidade solar fotovoltaica. Havemos de lá chegar, mas infelizmente com um atraso desnecessário. Mas também diz o ditado “mais vale tarde que nunca”.
Não posso terminar este artigo sem deixar de referir que a 12 de outubro de 2018 se assinalam os 30 anos da criação da APREN, à data designada de APMH. Para se perceber o que se passou em Portugal nestes 30 anos no que se refere à produção de eletricidade renovável em regime especial (PRE-ren), aquela em que se vai baseia, e se irá cada vez mais basear a produção nacional, devo referir os seguintes números:
Em 1988 o consumo nacional foi cerca de 21 TWh, a potência instalada em PRE-ren era de 89 MW que representavam cerca de 0.5% da produção.
Em 2017 o consumo nacional foi cerca de 50 TWh, a potência PRE-ren atinge 6 861 MW e representam cerca de 1/3 da produção nacional. Multiplicámos a potência por 77 e a eletricidade produzida por 70 vezes, isto em apenas 30 anos.
Se acrescentarmos a estes números o facto de que cerca de 93% da potência renovável de Portugal se encontra filiada na APREN, não posso deixar de sentir uma grande satisfação e orgulho por ter participado ativamente nesta transição, extensível a todos os que deram o seu melhor esforço a esta Associação, mas fundamentalmente a Portugal, durante estes 30 anos Associados, colaboradores e entusiastas pelo setor. Mas tudo isto só foi possível porque houve visão e estabilidade criado por um quadro regulatório e legislativo adequado, criado e desenvolvido por sucessivos governos.
O caminho não acabou, ainda há muito a percorrer para nos aproximarmos de ter em Portugal eletricidade 100% renovável. Agora os desafios são outros e só espero que não se estrague o que já foi feito, aproveitando o conhecimento de todos os que atuam no setor para vencer os novos desafios, pois: Portugal precisa da nossa energia.
António Sá da Costa é presidente da APREN – Associação Portuguesa de Energias Renováveis e Vice-Presidente da EREF – European Renewable Energy Federation e da ESHA – European Small Hydro Association. Licenciou-se como Engenheiro Civil pelo IST- UTL (Instituto Superior Técnico da Universidade Técnica de Lisboa) (1972) e tem PhD e Master of Science pelo MIT (Massachusetts Institute of Technology (USA) em Recursos Hídricos (1979). Foi docente do IST no Departamento de Hidráulica e Recursos Hídricos de 1970 a 1998, tendo sido Professor Associado durante 14 anos; tem ainda leccionado disciplinas no âmbito de cursos de mestrado na área das energias renováveis, nomeadamente na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa e na Escola Superior de Tecnologia e Gestão de Portalegre; Exerceu a profissão de engenheiro consultor durante mais de 30 anos, sendo de destacar a realização de centenas de estudos e projectos na área das pequenas centrais hidroeléctricas; Foi fundador do Grupo Enersis de que foi administrador de 1988 a 2008, onde foi responsável pelo desenvolvimento de projectos no sector eólico e das ondas e foi Vice-Presidente da APE – Associação Portuguesa da Energia de 2003 a 2011.