José Manuel Teixeira: 'Investimento Zero na área das sucatas'
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José Manuel Teixeira: 'Investimento Zero na área das sucatas'

Garante que não se importa que o chamem sucateiro porque nasceu enquanto empresário como sucateiro numa empresa familiar, porém a diversificação  de negócios - obrigatória com a crise no sector – torna-o cada vez menos sucateiro. José Manuel Teixeira, administrador da Transucatas, construiu em 50 anos empresas na área da gestão de resíduos ferrosos e não ferrosos, equipamentos eléctricos e electrónicos, resíduos industriais banais, veículos em fim de vida e fracção de plásticos mistos. Nos últimos anos, estreou-se no tratamento do lixo, na biomassa e na produção de combustíveis alternativos, a partir do lixo. Faz um balanço negro do sector dos materiais ferrosos e não ferrosos e garante que este ano o investimento nesta área será zero.    


Começou a sua actividade como sucateiro há 50 anos. Como é que era o sector nessa altura?

Iniciei a actividade como sucateiro em 1967/68. Foi uma empresa que começou como familiar – como a maioria das empresas na área das sucatas e dos materiais ferrosos e não ferrosos. Mesmo que hoje sejam sociedades anónimas, são empresas que tiveram origem em empresas familiares. É algo que não é único de Portugal, passasse na Europa e no mundo inteiro. Isso deve-se – no meu ponto de vista – ao controlo que estas empresas precisam de ter que a nível financeiro, quer em termos de actividade industrial.


Quais foram as principais fases pelas quais este sector passou desde a década de sessenta?

Este sector, antes da década de sessenta, praticamente não existia porque não havia actividade industrial em Portugal, só havia exportação de sucata e não havia consumo interno. Com o aparecimento da siderurgia nacional, na década de sessenta/setenta, houve uma procura enorme do produto sucata para consumo interno. Isto fez com que as empresas começassem a olhar para este tipo de actividade como algo com alguma rentabilidade e houve um crescimento de empresas nestas áreas, que desde essa altura ainda existem na sua maioria.


A década de 70 foi a década de ouro para o sector?

O pós 25 de Abril foi a época de crescimento. A época de ouro foi a década de noventa, porque teve a ver com o excesso de sucata que houve no país. Coincidente com o grande período das obras e o grande encerramento das unidades industriais em Portugal. Com o fim da grande indústria metalomecânica pesada, da grande indústria naval, apareceu muita sucata. Trata-se de um fluxo de sucata que engana. Foi uma sucata que apareceu em muita quantidade e desapareceu rapidamente, porque não houve continuidade. Produzíamos em Portugal desde os barcos, aos comboios e às barragens e já não fazemos nada disso.  


Ainda sobra alguma coisa?

Hoje a única empresa que tem essa componente em Portugal é a Autoeuropa. Não há  outra com actividade de relevo e peso a nível nacional.


Chegaram a receber aqui sucata da Autoeuropa?

Sim, durante cerca de dez a doze anos. Ultimamente não, porque houve uma mudança de estratégia da siderurgia nacional, que passou adquirir a sucata directamente – sem intermediários – havendo uma relação directa entre o produtor e consumidor final.


Foi um duro golpe para o sector.

Foi e está a ser um duro golpe para o sector porque foi uma experiência que começou na Autoeuropa há quatro – cinco anos -, mas já passaram esse modo de actuar para as grandes indústrias, nomeadamente a CP/Refer. Em que há já contratos directos. O sucateiro tem tendência a deixar de ter importância, havendo uma relação directa entre o produtor e consumidor.


Estamos aqui perante um monopólio?

Sim, eu às vezes pergunto onde está  Autoridade da Concorrência nestes casos.


Este tipo de sucata representava para o volume de negócios destas empresas que percentagem?

Bastante, não consigo precisar uma percentagem.


Em relação á vossa empresa?

10 a 15% da actividade. Isto a juntar à quebra da produção industrial em Portugal…


Que quebra nos últimos anos?

Estamos convencidos de que haverá uma quebra de 50 a 60% entre 2007 e 2014 neste sector.


Estas contas ainda não estão fechadas?

A actividade continua a decrescer.


Apesar deste ponto de situação, quais são as actividades que ainda alimentam este sector?

A área industrial desapareceu, praticamente, e a construção civil teve uma paragem com a crise de 2008. As sucatas estão a vir dos lixos urbanos, essencialmente, dos veículos em fim de vida e a parte agrícola. Ainda existe alguma actividade industrial agrícola, que ainda tem alguma peso – apesar de bastante menor. E há as remodelações e arranjos na construção civil e a pouca indústria que ainda vai laborando.


Os lixos urbanos representam que percentagem de volume de negócios?

Este fluxo não existia há 15 anos e hoje é feita essa triagem por obrigação ambiental. Representam 2 a 4%, a nível nacional. Esta percentagem significa bastante para o sector porque é um fluxo contínuo, não há quebras. Todos os dias se produz lixo.


Os veículos em fim de vida continuam com um peso significativo?

Sim, representam 10 a 12% da actividade do momento, mas já foram mais importantes. Tiveram quebras semelhantes aos outros sectores. Houve um incentivo a abate numa altura em que os números do abate já eram altos. A queda foi maior porque desapareceu este incentivo e desapareceu a capacidade financeira. Hoje estagnou e poderá haver algum crescimento, porque estão-se a vender alguns veículos. É uma actividade importante porque produz ferrosos e não ferrosos e alguns lixo-resíduos que são aproveitados por nós para a indústria de cimento.   


Não há um controlo de abate de veículos quando um particular – por exemplo – dá baixa da matrícula de um automóvel. Faz sentido?

Todo o controlo e transparência no processo são positivos. Há aqui várias questões. Nós enquanto entidade com licenciamento procedemos ao abate físico dos veículos, fazemos o primeiro passo em termos de documentação, mas depois o processo transita para o IMTT-Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestrese pode demorar um, três meses, seis meses a fazer o abate. O que acontece é que o particular – quando nos entrega o veículo – fica com a sensação de que o abate foi feito naquele dia e, por vezes, surgem impostos para pagar do tempo que transitou entre o momento em que o particular entregou o veículo no centro de abate e em que o IMTT procedeu ao abate efectivo em termos de documentação. 

Há outros problemas na gestão do IMTT? 

Sim, o IMTT acabou por aceitar abates de empresas que não estão licenciadas e de particulares. O que gerou algum descontrolo. Vai-se aos números oficiais e o número de abates feitos por empresas licenciadas é muito inferior ao número de abates feito pelos particulares directamente. Dá a sensação de que há uma série de empresas ilegais – ou não licenciadas – que fazem o abate e que concorrem com empresas que estão licenciadas e que respeitam obrigações ambientais. Deveria haver um site que rastreasse o percurso do carro a abater e onde o particular pudesse consultar a situação no momento actual da viatura que deu para abate. Dava uma maior transparência ao processo. Neste momento, não sabemos onde estão esses veículos, se foram abatidos, em que condições foram abatidos, se foram exportados…


Consegue vislumbrar caminho para o sector?

É difícil. Em 2008 e 2009, a pancada foi tão forte que os caminhos ficaram muito sinuosos. Enquanto empresários tivemos a capacidade de nos reinventar e fazemos coisas que nunca pensaríamos fazer há dez anos.  


Exportar não é uma opção?

Já exportamos 90% do que produzimos, para Espanha essencialmente.


Criaram novas áreas de negócio.

Não despedimos ninguém e até crescemos em número de trabalhadores. Virámo-nos para a área da madeira, transformação de biomassa, para os plásticos e para a produção de combustíveis alternativos, fazendo do lixo algo valorizável do ponto de vista energético. Apenas 4 a 5% dos resíduos que transacionamos vão para aterro. Estes novos negócios estão – em temos de volume de negócios – a ultrapassar a área dos materiais ferrosos e não ferrosos.


É casa vez menos sucateiro.

Sou cada vez menos sucateiro. Tem de haver redução do número de empresas e de redução da capacidade dessas empresas. 2015 será o ano do equilíbrio. Reduzimos muito o investimento e direcionámos o investimento para outros fluxos.

Em termos de investimento, esta área significou quanto no orçamento deste ano?

Zero por cento de investimento na área da sucata. Não há necessidade de haver investimento. Temos toda a capacidade instalada e já estamos a alocar equipamentos da área das sucatas a outros fluxos, porque não temos forma de os rentabilizar.

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