Recolha de biorresíduos: financiamento e envolvimento do cidadão estão entre as principais dificuldades elencadas pelos municípios
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Recolha de biorresíduos: financiamento e envolvimento do cidadão estão entre as principais dificuldades elencadas pelos municípios

A recolha seletiva de biorresíduos nas habitações é obrigatória desde janeiro de 2024, mas, apesar de uma tímida evolução registada no ano passado, a nível nacional, o retrato divulgado no 3.º Fórum Biorresíduos, que decorreu ontem na cidade do Porto, é de “um país a várias velocidades”, como descreveu Ana Cristina Carrola, Vogal do Conselho de Administração da Agência Portuguesa do Ambiente. Há, contudo, municípios que estão já no terreno, a implementar com sucesso projetos nesta área, e cinco deles estiveram no evento organizado pelo jornal Água&Ambiente, onde identificaram algumas das dificuldades que tiveram de ultrapassar para conseguirem entregar resultados. O acesso a financiamento e o envolvimento do cidadão na separação de mais este fluxo estão entre os principais desafios que foram elencados no painel “Municípios na linha da frente”, que reuniu responsáveis das autarquias de Seixal, S. João da Madeira, Fornos de Algodres, Viana do Castelo e Porto, numa conversa moderada pelo consultor João Pedro Rodrigues. 

A “falta de financiamento do setor” foi um dos problemas sublinhados por Ana Campos, Chefe da Divisão de Recolha de Resíduos Sólidos Urbanos da Câmara Municipal do Seixal. Um desafio ainda mais complexo para os municípios da Área Metropolitana de Lisboa, que não beneficiam de apoios financeiros para o setor dos resíduos ao abrigo do Portugal 2030. Por outro lado, os investimentos em alta para contrariar o esgotamento iminente dos aterros de resíduos urbanos, previstos no plano TERRA, deverão ter impacto nas tarifas que os municípios pagam para entrega dos resíduos recolhidos. “Municípios sem financiamento e com custos tarifários acrescidos”, resumiu Ana Campos, tem conduzido a “uma situação de grande impasse” entre os municípios da região. Como resposta, o município tem procurado minimizar a deposição em aterro e otimizar o investimento já realizado, nomeadamente através do reforço da adesão nas zonas onde o serviço de recolha de biorresíduos está já disponível. Neste concelho, que abrange cerca de 167 mil habitantes e 82 927 alojamentos, numa área de 95,5 km2, a recolha seletiva de biorresíduos iniciou-se em 2018, através de um modelo porta-a-porta em zonas de moradias, prevendo-se agora a colocação de contentores de proximidade nas áreas de elevada densidade urbana. A taxa de cobertura deste serviço situa-se atualmente nos 30%, revelou Ana Campos, e, em 2024, foram recolhidas 5655 toneladas de biorresíduos, o que corresponde já a 42% da meta traçada pelo município, no seu plano de ação (PAPERSU), para o final desta década.  

 

Envolver os cidadãos

Garantir o envolvimento dos cidadãos na separação deste novo fluxo foi outra dificuldade identificada pelos vários municípios com projetos implementados nesta área.

Vera Neves, Dirigente da Unidade do Ambiente da Câmara Municipal de S. João da Madeira, salientou o “desconhecimento” que muitos cidadãos tinham sobre o fluxo de biorresíduos e os benefícios da sua valorização. “As pessoas não sabiam o que eram biorresíduos”, notou, e “foi preciso um grande reforço” da sensibilização “para termos aderentes”. No concelho “mais pequeno do país”, que ocupa uma área de 8 km2, onde residem 22.789 habitantes, a recolha seletiva porta-a-porta de biorresíduos chega hoje a cerca de 20% dos alojamentos, para além de estar disponível um serviço de recolha de resíduos verdes ao domicílio. A partir deste ano serão disponibilizados novos equipamentos coletivos que vão permitir alargar a cobertura do serviço até abranger a totalidade do concelho em 2027. Em 2024, foram recolhidas 1206 toneladas de biorresíduos e Vera Neves antecipa que a meta do município para 2030 possa até ser alcançada dois anos antes.     

A recolha seletiva de biorresíduos no segmento doméstico “só é possível iniciar com um contacto muito próximo com os cidadãos”, reconheceu também Luís Assunção, Vice-Presidente da Porto Ambiente, “caso contrário, não teríamos adesão”. Segundo o gestor, um dos fatores que gera alguma “resistência” à deposição destes resíduos é a dificuldade de “higienização” dos contentores, o que levou a Porto Ambiente a investir na disponibilização de sacos de papel para tornar mais cómoda esta separação. “Com o saco de papel, o balde tem uma necessidade de higienização completamente diferente”, assegura. No município do Porto, a recolha seletiva de biorresíduos alimentares através de contentores de proximidade iniciou-se em 2021 e abrange hoje cerca de 80.000 alojamentos e um parque de 630 equipamentos. Este modelo complementa a recolha seletiva porta-a-porta residencial que avançou ainda em 2018 em algumas zonas do concelho, bem como a recolha deste fluxo no segmento não doméstico que existe desde 2006. No total, em 2024, a recolha de biorresíduos alimentares ascendeu a 10.768 toneladas, enquanto a componente de verdes representou 3487 toneladas. 

Alexandre Lote, Vice-Presidente da Câmara Municipal de Fornos de Algodres também realçou, na sua intervenção, o desafio de “chegar aos cidadãos”, nomeadamente em municípios “de baixa densidade populacional” e com um índice de envelhecimento elevado. No município de Fornos de Algodres residem 4403 habitantes, mas numa área que se estende por mais de 130 km2. “As formas de comunicação têm de ser adaptadas”, vincou. O serviço de recolha de biorresíduos arrancou em 2023 e hoje abrange 55% da população residente. No último ano, foram recolhidas 90 toneladas de biorresíduos através do sistema porta-a-porta e desviadas 73 toneladas por via da compostagem.  

Noutros municípios, de maior densidade urbana, a compatibilização de vários usos no espaço público também se tem revelado desafiante. José Emílio Viana, Diretor Delegado dos Serviços Municipalizados de Viana do Castelo, lembrou que o espaço urbano é “finito” e que, hoje em dia, tem de acomodar contentores para vários fluxos de resíduos, incluindo os biorresíduos e o multimaterial, mas também equipamentos para deposição de óleos alimentares usados ou resíduos têxteis. “É uma dificuldade a sua localização”, notou, em particular nas áreas urbanas. 

No concelho de Viana do Castelo, que se prolonga por 319 km2, onde residem mais de 85 mil habitantes, a recolha seletiva de biorresíduos, no segmento doméstico, avançou em 2018, com o projeto “Viana Abraça”, que envolveu a instalação de 480 contentores com controlo de acesso em áreas urbanas e a distribuição de 8122 compostores em zonas rurais. Os 22.428 alojamentos servidos representam 51% de acessibilidade a este serviço. Em 2024, foram recolhidas 1700 toneladas deste fluxo e desviadas 2205 toneladas através da compostagem doméstica.  

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