
Colunista Susana Rodrigues (Resíduos - Recolha): O fim do plástico descartável
Este mês devo destacar duas notícias que chegaram recentemente de dois países membros “de peso”: enquanto o Governo Francês proibiu todas as louças de plástico no país até 2020, a Alemanha quer adiar a introdução de metas de reciclagem mais duras a nível da UE, enquanto os métodos para calcular a quantidade de material reciclado não sejam clarificados, de acordo com uma notícia divulgada pela ENDS.
A primeira medida resulta da lei de “Transição da matriz energética para o crescimento verde” promulgada pelo Governo Francês há cerca de um ano, que tem como um dos objectivos diminuir em 10% até 2020 os resíduos urbanos produzidos pelos franceses (com base em 2015). Já no início deste ano, o mesmo Governo proibiu todos os supermercados de venderem sacos de plástico aos consumidores, em linha com a medida adoptada em Portugal em Fevereiro de 2015, de proibição da disponibilização de sacos de plástico grátis (artigo de opinião de Março de 2015). Agora é a vez dos copos, pratos e talheres de plástico descartáveis.
A ideia, que partiu do partido ecologista Os Verdes, visa reduzir a propagação de substâncias tóxicas no meio ambiente. Além da questão dos resíduos, a medida pretende também diminuir os gastos de energia pela indústria de transformação de plástico. Os novos pratos e talheres que irão substituir o plástico descartável deverão conter 50% de matérias-primas provenientes de fontes renováveis até 2020 e 60% a partir de 2025. Os fabricantes têm até 2020 para substituir o plástico por materiais biodegradáveis, que possam ser compostáveis.
Dada a pegada ambiental inegável que estes materiais deixam, as medidas são de aplaudir. Não é preciso detalhar os princípios na base da tão falada “Economia Circular” ou “Crescimento Verde”, para concluir que a noção de “produto descartável” deve ter um fim, em particular se for de plástico. Tratam-se de resíduos gerados em enormes quantidades que, na minha opinião, justificam medidas de primeira linha. Portugal é dos países europeus onde se utilizam mais sacos de plástico, com uma capitação de 466 sacos/hab.ano. Já em França, as estimativas apontam que quase cinco mil milhões de copos de plástico por ano são deitados fora, dos quais apenas 1% são reciclados. Estas medidas, na base da pirâmide de gestão de resíduos, a prevenção, podem assim evitar custos de gestão de resíduos desnecessários.
São medidas eficazes, no entanto, polémicas. Tal como aconteceu com os sacos de plástico, esta medida levantou uma onda de críticas em França, liderada pelos fabricantes, que pediram a intervenção da União Europeia, alegando que a medida “viola a livre circulação de bens”, e que irá gerar perda de postos de trabalho. A medida não foi consensual dentro do próprio Governo Francês, com oposição da Ministra do Ambiente, Energia e Mar, por considerar a medida “anti-social”, alegando que estes materiais são essencialmente usados por famílias de baixos rendimentos, e que os biodegradáveis serão mais caros. Outro argumento é que existe a possibilidade de aumento do uso de pratos e copos de papel, e que, no futuro, os consumidores tenderão a depositar estes resíduos em locais inapropriados, partindo do raciocínio de que são biodegradáveis, um argumento que na minha opinião não faz sentido.
Provocação do mês
Voltando à segunda notícia com que comecei este artigo, de que a Alemanha quer ver os métodos para calcular a quantidade de material reciclado clarificados, pergunto se, em Portugal, os dados divulgados pela APA no Relatório sobre os Resíduos Urbanos para 2014 já foram revistos, onde claramente existia um problema nos métodos de cálculo utilizados (ver Rui Berkemeier, Maio de 2015).
Lanço ainda outra provocação: Será que depois da proibição dos sacos de plástico gratuitos pelo anterior Governo, Portugal irá seguir o exemplo Francês e adoptar mais medidas de prevenção de resíduos, mesmo que polémicas?
Susana Sá e Melo Rodrigues é licenciada em Engenharia do Ambiente pelo Instituto Superior Técnico (IST/UTL) e tem uma pós-graduação em Gestão Integrada e Valorização de Resíduos da Faculdade de Ciências e Tecnologia (FCT/UNL), onde está a desenvolver o seu doutoramento em Ambiente, centrado na análise dos sistemas de recolha de resíduos. Iniciou a sua actividade profissional no Instituto da Água, onde foi membro da Comissão de Acompanhamento da Directiva-Quadro da Água. Foi consultora na área de projecto e de fiscalização ambiental de empreitadas na FBO - Consultores, S.A. (DHV international consultancy and engineering group), e de 2004 a 2014 trabalhou na HPEM - empresa municipal de Sintra responsável pela recolha de resíduos urbanos e limpeza pública, como Gestora do Departamento de Planeamento e posteriormente nos SMAS de Sintra. Esteve até Setembro de 2015 na ECOAmbiente, S.A., como Directora do Departamento Técnico e Comercial. É membro do grupo de investigadores da FCT/UNL, Waste@Nova e do MARE - Centro de Ciências do Mar e do Ambiente, centrando a seu trabalho de investigação na área de Gestão de Resíduos. A autora não segue, por opção, o novo acordo ortográfico.