
Combustíveis fósseis vão dominar nos transportes enquanto não existirem mais alternativas
Os combustíveis fósseis vão continuar a dominar no sector dos transportes enquanto não se encontrarem mais alternativas energéticas ao nível macro, nomeadamente para o transporte aéreo, transporte marítimo e transporte de mercadorias, que representam o grosso do consumo de energia.
A ideia foi defendida pelo professor do Instituto Superior Técnico da Universidade de Lisboa, Tiago Farias, que falou sobre as perspectivas de futuro para a mobilidade e energia numa conferência organizada pela Associação Portuguesa da Energia. O evento, subordinado ao tema “Sistema Energético: A mudança no horizonte 2030”, decorreu na manhã de quarta-feira, 25 de Novembro, no Centro Cultural de Belém.
O que têm em comum um balão de ar quente e um cesto de fruta tropical? “Ambos percorreram 40 mil quilómetros”. O problema, sublinha Tiago Farias, é que os preços dos transportes estão muito competitivos, mas não incluem uma externalidade que se chama: gases com efeito de estufa. “Antigamente comíamos a fruta da época”, lembra
O especialista, que falava para uma plateia com muitos representantes de petrolíferas, disse que o problema não é da indústria, mas das qualidades ímpares dos megajoules da gasolina e gasóleo que ultrapassam as baterias de lítio por serem ainda imbatíveis em termos de custo, de funcionalidade, flexibilidade, facilidade de armazenamento e transporte. “Temos que fazer mais. Precisamos de jovens talentos que tragam soluções inovadores, disruptivas e integradas”, exaltou.
No horizonte de 2030 – demasiado “curto para o sector dos transportes” – é possível fazer trabalho. Por essa altura 70 por cento da população vai estar a viver e a consumir recursos nas cidades e é aqui que “vamos ganhar ou perder as grandes batalhas”.
Para isso é preciso gerir melhor as infra-estruturas, defende Tiago Farias. Na área dos transportes públicos, por exemplo, existem tecnologias inovadoras, mas “não existe capacidade financeira por parte do sector que tem margens operacionais muito baixas ou fortemente negativas” já que a bilhética não cobre os custos. “Mesmo que se tragam novas energias não sei se vamos lá”, observa.
Foi você que pediu um veículo elétrico?
O veículo eléctrico é um produto exactamente igual aos que já existem no mercado apenas com algumas diferenças: é mais caro, tem menos autonomia e implica maior dificuldade de abastecimento, ironiza Tiago Farias. Para o especialista é aqui que reside o insucesso deste tipo de mobilidade.
“Alguém pediu um carro que não seja o que nós já temos? Estamos satisfeitos individualmente. Obviamente que o planeta precisa de algo mais limpo, mas para isso é preciso inovar. Criar um carro com outras funcionalidades que além de muitas coisas também nos permita circular, tal como sucedeu com o iPhone. Quem inventou o iPhone não veio dizer que era para substituir o telefone. O mundo da mobilidade precisa disso”, exemplifica.
Criatividade precisa-se e é preciso ariscar, incentiva. Tiago Farias espera que seja a indústria da mobilidade e energia a propor a mudança. “Ficaria muito triste se fosse uma Google ou uma Tesla ou Apple a fazê-lo”.
Tudo vai demorar tempo, avisa. Até porque a indústria da mobilidade é muito lenta e a unidade temporal é a década. Tiago Farias gostaria que a mudança ocorresse por aparecer no mercado um produto "disruptivo e irecusável" que atraísse clientes, num movimento 'bottom-up', e não 'top-down', por iniciativa do Governo, como aconteceu na Noruega. “O carro elétrico tem esses condimentos, mas tem que se casar com outros players”. E, já agora, dava jeito que o preço do petróleo subisse um pouco. “Assim não vamos lá”, concluiu com humor.
Ana Santiago