
INESC TEC: Apagão evidenciou sensibilidade do sistema à baixa inércia associada às renováveis
O colapso do sistema elétrico ibérico, ocorrido no dia 28 de abril, expôs vulnerabilidades causadas pela baixa inércia do sistema, revela uma análise do INESCT TEC sobre o apagão, que destaca que o incidente teve origem num sistema fortemente apoiado por energias renováveis, com reduzida geração síncrona, tornando-o mais sensível a desequilíbrios.
A investigação do INESC TEC revela também que, apesar de as causas exatas ainda estarem a ser apuradas, é provável que a conjugação de três fatores tenha contribuído para o apagão: perda súbita de geração, baixa inércia provocada pela elevada penetração de renováveis, e oscilações de frequência mal amortecidas — um fenómeno conhecido como “estabilidade de pequenos sinais”.
Face à crescente dependência de fontes renováveis com conversores eletrónicos de potência, os especialistas sublinham a necessidade de reforçar os sistemas de monitorização e proteção, bem como a adoção de tecnologias como conversores “grid-forming”, capazes de emular o comportamento de geradores síncronos. O INESC TEC defende ainda a integração de soluções baseadas em inteligência artificial e gémeos digitais que antecipem comportamentos da rede e apoiem os operadores na tomada de decisão.
Como narra o INESC TEC, na manhã do apagão, o sistema elétrico espanhol operava com cerca de 33 GW de carga, maioritariamente abastecido por energia solar (23 GW) e eólica (3 GW), exportando eletricidade para Portugal, França e Marrocos. A geração síncrona representava apenas uma fração da capacidade total. Em Portugal, a carga rondava os 5.800 MW, com mais de 2.100 MW direcionados para o bombeamento, grande parte alimentada pela energia importada da vizinha Espanha.
Por volta das 11h20, sensores de medição avançada (PMUs) instalados em Málaga e no Porto detetaram oscilações de frequência anómalas. Estas flutuações, entre 0,2 e 0,7 Hz, permaneceram no sistema até ao momento do colapso. Às 12h33min16s, duas perdas de geração no sudeste de Espanha ocorreram em poucos segundos, num cenário raro classificado como contingência n-2. Seguiu-se uma rápida queda de frequência, levando ao desligamento automático de centrais fotovoltaicas e à desconexão em cascata de outras unidades.
Cerca de 15 GW de capacidade de geração foram perdidos em apenas cinco segundos. A frequência no sistema ibérico caiu abruptamente, forçando o acionamento de mecanismos de proteção e o desligamento da interligação com França. Em Portugal, a variação da frequência ultrapassou 1,5 Hz por segundo, revelando a fragilidade do sistema perante perturbações rápidas. "O déficit de produção foi tão grande que a frequência continuou a cair", refere o INESC TEC.
As respostas de emergência ativaram cortes de carga automáticos, priorizando estações de bombeamento e consumidores com contratos interruptíveis. No entanto, as medidas não impediram o colapso total. Seguiram-se procedimentos de recuperação com recurso a centrais com capacidade de black-start, como Castelo de Bode e Tapada do Outeiro. A reposição da rede foi feita de forma faseada para evitar novas instabilidades. Até à noite, a REN já tinha restabelecido energia em quase todas as subestações portuguesas, com 2,5 milhões de consumidores novamente com eletricidade.
O evento de 28 de abril reforça a importância estratégica da rede elétrica enquanto infraestrutura crítica. Segundo o INESC TEC, deve ser assegurado um planeamento regulatório adequado, que incorpore critérios de resiliência e reconheça a interdependência com outras infraestruturas vitais, como telecomunicações e abastecimento de água.