Jaime Melo Baptista: recuperação dos poderes tarifários da ERSAR é essencial para um setor sustentável
A publicação do decreto-lei que restabelece os poderes da Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR) no que toca à fixação de tarifas dos sistemas de titularidade estatal e regulamentação e fiscalização da aplicação de tarifas nos sistemas municipais, revogados pela Lei do Orçamento de 2021, foi recebida com otimismo por Jaime Melo Baptista, Conselheiro Estratégico da Lis-Water, que, contactado pelo Jornal Água&Ambiente, considerou este restabelecimento uma medida crucial para a sustentabilidade económica do setor, destacando a importância de uma regulação forte e equilibrada.
“Regras tarifárias vão ajudar os municípios a resolver problemas estruturais”
A revogação dos poderes da ERSAR em 2021, que limitou a intervenção da entidade na área económica, é vista por Jaime Melo Baptista como um erro que prejudicou gravemente o setor, particularmente as entidades de titularidade municipal. “Mais de 50% dos operadores municipais têm resultados negativos e não conseguem cobrir os seus custos com as receitas tarifárias,” explica. Segundo o especialista, essa situação é ainda mais preocupante porque muitos municípios não contabilizam todos os custos que deveriam, como amortizações de investimentos e despesas de reabilitação, o que agrava ainda mais a sua insustentabilidade financeira.
Para Jaime Melo Baptista, a recuperação dos poderes tarifários pela ERSAR é uma oportunidade de corrigir essa trajetória negativa, sem colidir com a autonomia municipal. O modelo agora adotado não implica uma intervenção direta sobre as tarifas municipais, mas sim uma atuação a dois níveis: “ex ante”, definindo as regras de cálculo tarifário, e “ex post”, através da fiscalização e eventual intervenção em casos de incumprimento. Esta abordagem, segundo o Conselheiro Estratégico da Lis-Water, compatibiliza a necessidade de uma regulação económica forte com a autonomia local.
Jaime Melo Baptista sublinha que a intervenção da ERSAR, devidamente aplicada, ajudará a resolver um dos maiores problemas estruturais do setor: a insustentabilidade financeira de muitos operadores. “As análises mostram que a pressão de subida das tarifas, que poderá ocorrer, não irá colocar as famílias numa situação de vulnerabilidade económica,” afirma, acrescentando que Portugal continuará a ter tarifas de água entre as mais baixas da Europa, mesmo com eventuais aumentos.
Considera ainda que a recuperação dos poderes da ERSAR ajudará também a garantir um serviço público de qualidade no futuro, pois permitirá aos operadores municipais realizar os investimentos necessários à reabilitação das infraestruturas e à adaptação aos novos desafios. Além disso, destaca a importância de mecanismos de proteção social, como a tarifa social, para apoiar as famílias mais vulneráveis.
Quanto à reação dos municípios a este novo modelo de regulação tarifária, segundo Jaime Melo Baptista, pode variar. No entanto, acredita que as regras nacionais de bom senso e racionalidade que agora são impostas beneficiarão tanto os municípios como o setor como um todo. “Manter a autonomia dos municípios e, ao mesmo tempo, garantir que há uma regulação económica eficaz é uma solução equilibrada,” defende, sublinhando que esse equilíbrio é essencial para assegurar a sustentabilidade financeira do setor e, consequentemente, a qualidade dos serviços prestados às gerações futuras.
No cenário atual, em que muitos operadores municipais enfrentam dificuldades financeiras graves, Jaime Melo Baptista considera que este restabelecimento dos poderes da ERSAR é uma medida essencial para garantir a sustentabilidade do setor e evitar a degradação dos serviços. A falta de investimentos na reabilitação e na modernização das infraestruturas poderá, segundo ele, gerar um problema de justiça intergeracional, ao transferir para as próximas gerações os custos de um setor que não se modernizou a tempo.
Sobre este tema, a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) informou o Jornal Água& Ambiente que irá realizar uma reunião prévia antes de se pronunciar publicamente sobre a questão.
O Jornal Água&Ambiente contactou ainda a Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR), mas até à hora de publicação desta peça, não obteve resposta.