
“O biometano é uma urgência premente” em Portugal, diz CEO da Floene
À margem da cerimónia de apresentação do projeto ‘Indústria de Futuro - Roteiro para a Introdução dos Gases Renováveis no Setor Industrial Nacional’, que teve lugar, em Lisboa, a 21 de janeiro, o Água&Ambiente Online falou com Gabriel Sousa, CEO da Floene, sobre o futuro dos gases renováveis em Portugal.
Uma das principais preocupações manifestadas no evento incide na lentidão do desenvolvimento do mercado do biometano. Para Gabriel Sousa, o biometano “é uma solução de energia mais imediata, com tecnologia madura, em que o caminho é claramente mais óbvio e imediato”, sendo que outros países já o fizeram e Portugal tem bons exemplos a seguir.
“O biometano, sendo um gás renovável e uma solução de energia verde, é uma molécula que é em tudo igual à do gás natural. A substituição do gás natural por biometano automaticamente descarboniza, elimina emissões e não tem qualquer custo de transformação, nem de conversão de equipamentos do lado dos consumidores. Tem todas estas virtudes e é uma urgência mais premente”, explica.
E reconhece que o biometano em Portugal “está mais atrasado do que noutros países da Europa”, lembrando que passa já quase um ano desde que foi aprovado o Plano de Ação do Biometano, com metas ambiciosas, e que prevê o desenvolvimento de um conjunto de ações “que até agora não viram a luz do dia”. Está prevista a constituição de grupos de trabalho e a implementação de medidas que continuam por avançar/concretizar, insiste. “É preciso juntar stakeholders e avançar com estes grupos de trabalho”, apela. Gabriel Sousa diz que o problema da regulação será certamente uma realidade quando os grupos de trabalho começarem a trabalhar e não tem dúvidas de que “irão encontrar linhas de ação que estarão relacionadas com aspetos regulamentares e legislativos que são cruciais”.
Como exemplo, “é bom lembrar que muitos países conseguiram encontrar mecanismos e incentivos, seja na produção, seja na injeção das redes, que são absolutamente cruciais para que esta energia se torne uma realidade”. E sublinha que o biometano permite descarbonizar de uma forma muito fácil. Não é preciso substituir nada nas nossas casas e nas nossas indústrias”, constata.
Sobre o potencial em Portugal, o CEO da Floene diz que os números apontam para um potencial de biometano injetável na rede de distribuição de gás que “pode andar à volta dos 14 terawatt-hora (TWh)”, dados constatados num estudo de 2024 da Floene com a Roland Berger. “O potencial de produção é ainda maior contando com outras aplicações, para mobilidade ou autoconsumo” adianta.
Acrescenta ainda que o biometano “não representa apenas uma solução para a descarbonização do sistema energético e dos consumos de energia, representa, ao mesmo tempo, uma solução para o problema dos resíduos que Portugal tem. E constituiu um impulso para a economia circular que ajuda a valorizar resíduos, seja no setor agropecuário, seja no dos resíduos sólidos urbanos”.
Hidrogénio
Já no hidrogénio, Gabriel Sousa salienta que Portugal “teve alguma ambição, até porque fomos dos primeiros países europeus a definir uma estratégia nacional, ainda que necessitemos de um pouco mais de tempo, mas não vejo que estejamos atrasados face a outros países”.
E dá o exemplo do projeto-piloto da Floene no Seixal, lançado em março de 2023, com injeção de hidrogénio verde na rede de distribuição de gás e que abastece um conjunto de 82 clientes residenciais, terciários e industriais. “Este projeto já nos permitiu ver que os materiais que utilizamos na rede que está construída são perfeitamente aptos ao funcionamento com hidrogénio e também permite confirmar, seja na indústria, seja nas casas das pessoas, que a mistura que estamos a fazer de hidrogénio na rede (no caso do Seixal, estamos a operar com 16%) não tem nenhum problema e não é necessário alterar nenhum equipamento”, explica Gabriel Sousa.
Depois de uma fase de testes, estes clientes passaram a ser abastecidos por uma mistura de hidrogénio verde com gás natural, aumentando a percentagem de hidrogénio até um máximo de 20%. O hidrogénio é produzido localmente, com energia 100% renovável, no Parque Industrial do Seixal, pela empresa portuguesa Gestene. Depois de produzido e armazenado, o hidrogénio percorre 1400 metros num gasoduto de polietileno, igual a cerca de 95% da rede de gás utilizada em Portugal, até uma estação, onde é misturado com gás natural, sendo depois distribuído aos clientes.
Além deste projeto, Gabriel Sousa dá outro exemplo prático, e à escala real, desenvolvido na zona de Rio Maior, e que entrará em funcionamento durante o ano de 2025. “A tecnologia é a mesma que foi testada no Seixal, o nível de mistura será idêntico, a única diferença é que, em vez de serem 82 clientes, irão ser 13 mil. É um pequeno passo para descarbonizar e reduzir emissões. Portanto, não acho que estejamos atrasados no hidrogénio face aos outros países da Europa. Onde é urgente avançar é no biometano”, insiste.
Como balanço dos últimos dos anos do projeto ‘Indústria de Futuro - Roteiro para a Introdução dos Gases Renováveis no Setor Industrial Nacional’, o CEO da Floene destaca o aumento de sensibilização, conhecimento, capacitação, partilha de informação e proximidade, com vários eventos no País, com a realização de seis workshops regionais, inquéritos setoriais e energéticos, seminários e cursos de formação, envolvendo mais de 2350 inscritos, 280 empresas e mais de 30 setores económicos.
“Acreditamos que há hoje uma maior capacidade da indústria de pensar na descarbonização e no contributo que os gases renováveis podem ter neste processo, e essa capacitação e consciência é importante para que, quando se olha para o futuro e se fazem escolhas, estas sejam mais sustentáveis e evitemos o desperdício de dinheiro em soluções que são mais onerosas e, ao mesmo tempo, com um défice de diversificação de fontes de abastecimento”, conclui Gabriel Sousa.