A Gestão dos Resíduos Têxteis, na era da Ultra-Fast Fashion

A Gestão dos Resíduos Têxteis, na era da Ultra-Fast Fashion

A moda rápida e barata - conhecida como fast fashion mudou radicalmente a forma como compramos e nos vestimos, originando que, na Europa, estejam a ser gerados anualmente cerca de 5,2 milhões de toneladas de resíduos têxteis pós-consumo, constituídos por uma elevada mistura de fibras de baixa qualidade e de acessórios, o que origina que apenas cerca de 22% dos resíduos têxteis são recolhidos separadamente para reutilização ou reciclagem. 

"O grande volume de resíduos produzidos, as baixas taxas de recolhas e sua complexidade para reciclagem, aliado aos significativos impactes ambientais do setor, levou a Comissão Europeia a publicar, em março de 2022, a Estratégia da União Europeia (UE) em prol da Sustentabilidade e Circularidade dos Têxteis."

O grande volume de resíduos produzidos, as baixas taxas de recolhas e sua complexidade para reciclagem, aliado aos significativos impactes ambientais do setor, levou a Comissão Europeia a publicar, em março de 2022, a Estratégia da União Europeia (UE) em prol da Sustentabilidade e Circularidade dos Têxteis. Esta visa criar um setor mais ecológico, mais competitivo, mais moderno e mais resistente aos choques mundiais. 

Desde essa data, a UE tem trabalhado num vasto conjunto de propostas legislativas, sendo de destacar, a do Ecodesign e do Passaporte Digital, a Responsabilidade Alargada do Produtor, a Proibição de Envio de Resíduos Têxteis para fora da Europa e a revisão da Diretiva Quadro sobre Resíduos. Embora ainda não esteja totalmente claro como todas estas normativas se aplicarão ao setor têxtil, tudo indica que abrangerão têxteis usados, resíduos, acessórios e calçado.

Contudo, enquanto a Europa trabalha no sentido de tornar o setor mais sustentável e circular, assistimos a uma revolução do mercado com marcas orientais como a SHEIN ou TEMU a transformar a indústria têxtil mundial, com a Ultra-Fast Fashion.

"A Ultra-Fast Fashion é uma versão ainda mais extrema da fast fashion, caracterizada por ciclos de produção cada vez mais curtos, grande variedade de peças, preços ainda mais baixos e roupas de baixa qualidade."

A Ultra-Fast Fashion é uma versão ainda mais extrema da fast fashion, caracterizada por ciclos de produção cada vez mais curtos, grande variedade de peças, preços ainda mais baixos e roupas de baixa qualidade. Impulsionado pela popularidade das redes sociais, em particular de plataformas como o TikTok e o Instagram, temos assistido a um crescimento exponencial dessas marcas, com um modelo de negócio disruptivo e oposto à estratégia definida pela União Europeia.

Deste modo, é urgente concretizar uma estratégia competitiva para tornar o setor mais sustentável e circular. Para materializar a estratégia Europeia, será fundamental avançar nos seguintes temas:

  • Legislação: Finalizar a revisão da Diretiva Quadro dos Resíduos, em especial ao nível das definições do que é ou não resíduo têxtil e do fim do estatuto de resíduos;
  • Capacidade: Escassez de capacidade para escoar toda a quantidade de têxteis que vai chegar aos sistemas de gestão  de resíduos urbanos a partir de 2025 e conseguir garantir a sua reutilização/ reciclagem;
  • Financiamento: Urgente promover a inovação, desde o desenvolvimento de materiais têxteis mais sustentáveis, à melhoria das tecnologias de reciclagem ao desenvolvimento de novos produtos a partir de resíduos têxteis;
  • Governação: Necessidade de harmonização dos sistemas a nível da UE para garantir alinhamento entre os Estados Membros e os diversos intervenientes na cadeia de valor do setor;
  • Social: Importa garantir a inclusão das organizações de cariz social que podem desempenhar um papel determinante na área da reutilização.

 

Em Portugal, como estamos?

Segundo dados da Agência Portuguesa do Ambiente, em 2022, existiam nos resíduos urbanos cerca de 198 mil toneladas de resíduos têxteis. De acordo com a legislação em vigor, a recolha seletiva de resíduos têxteis tem de iniciar até 1 de janeiro de 2025 e está prevista a definição da Responsabilidade Alargada do Produtor para os resíduos têxteis até ao final de 2024.

Contudo, a maio de 2024, ainda existe um longo caminho a percorrer para que se consiga efetuar a gestão dos resíduos têxteis, porque a recolha seletiva do resíduo é somente uma das etapas da cadeia de valor do processo, faltando definir tudo o resto, tal como:

  • Clarificar o próprio conceito de resíduo, atualmente os têxteis descartados nos roupões de via pública, não são considerados resíduos, definindo quais os materiais incluídos pelo fluxo;
  • Não existe uma estimativa dos quantitativos de resíduos recolhidos (quer nos contentores localizados na via pública, quer pelas maiores cadeias de venda de roupa) com vista a estimar quantitativos para a situação de referência;
  • Não existe capacidade instalada de triagem, nem se encontra definido em que categorias o material deve ser separado ou quais as especificações técnicas para a retoma do resíduo;
  • Não existe mercado/escoamento para o resíduo têxtil pós-consumo;
  •  Em que moldes vai ser implementada a Responsabilidade Alargada do Produtor, elemento essencial auxiliar os Sistemas de Gestão de Resíduos  Urbanos a suportar os elevados custos da recolha seletiva, triagem e reciclagem.

"Dada a perceção do cidadão ser muito negativa relativamente ao tratamento dos resíduos têxteis é fundamental assegurar que, quando se iniciar a recolha seletiva, o setor consegue demonstrar claramente que consegue dar o correto encaminhamento ao resíduo e introduzir novamente na Economia."

Dada a perceção do cidadão ser muito negativa relativamente ao tratamento dos resíduos têxteis é fundamental assegurar que, quando se iniciar a recolha seletiva, o setor consegue demonstrar claramente que consegue dar o correto encaminhamento ao resíduo e introduzir novamente na Economia.

Resumindo, ainda existe muito trabalho a efetuar e face à importância do setor em Portugal, a definição de uma Estratégia Integrada para o resíduo têxtil, assente na hierarquia de resíduos, a potenciar envolver/potenciar todos os intervenientes da cadeia de valor, contribuir para o cumprimento das metas de reciclagem e auxiliar a alavancar o setor a tornar-se mais sustentável, ajudando o setor a manter-se na vanguarda mundial da circularidade.

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