Dúvidas sobre a 35.ª Cimeira Ibérica

Dúvidas sobre a 35.ª Cimeira Ibérica

Decorreu em 23 de outubro, em Faro, a 35ª Cimeira Ibérica. Do que ao público em geral foi dado a conhecer, pode constatar-se que nesta Cimeira foram definidas melhorias e complementos à “Convenção de Albufeira”, Convenção sobre Cooperação para a Proteção e o Aproveitamento das Bacias Hidrográficas Luso-Espanholas, de 1998.

Em relação ao rio Tejo foram estabelecidos os princípios orientadores para que seja garantido um caudal diário no rio Tejo, a partir da barragem de Cedilho, com o objetivo de manter os caudais circulantes, em contrapartida aos atuais caudais trimestrais em vigor, que não possibilitavam a melhor saúde do rio. Considera-se que os princípios adotados são corretos.

Já relativamente ao rio Guadiana o acordo obtido para um regime de caudais mensais na secção de Pomarão, com vista a garantir o bom estado do estuário e a distribuição equitativa dos caudais disponíveis para o uso de ambos os Estados, pode levantar muitas perguntas ainda não cabalmente respondidas.

A primeira dúvida centra-se na decisão de escolher apenas um local para definir os caudais mínimos mensais no rio Guadiana - o de Pomarão. Ora este local é o ponto fronteira onde confluem dois rios, um vindo de Portugal - o próprio Guadiana - e outro proveniente de Espanha - o Chança. Recorda-se que qualquer um destes rios têm albufeiras de grande capacidade. Nestas condições, faria todo o sentido definir a quota parte de comparticipação de cada um dos rios para o caudal mínimo no Pomarão. Mas nada é referido no documento final da Cimeira de Faro!

(...) faria todo o sentido definir a quota parte de comparticipação de cada um dos rios (Tejo e Chança) para o caudal mínimo no Pomarão. Mas nada é referido no documento final da Cimeira de Faro!

Outra questão prende-se com o facto de nada ser mencionado quanto ao caudal mínimo no ponto de entrada do rio Guadiana em Portugal, em Badajoz. Pressupõe-se, mas fica a dúvida, se continuam em vigor os caudais “ecológicos” definidos na “Convenção de Albufeira”, de 2m3/segundo médios diários, mas que deixam de ser obrigatórios logo que o armazenamento nas seis albufeiras de referência da bacia hidrográfica do Guadiana (lado espanhol) de: La Serena (3219 hm3 ), Zújar (309 hm3 ), Cijara (1505 hm3 ), García Sola (554 hm3), Orellana (808 hm3) e Alange (852 hm3), que totalizam 7237 hm3 (mais do que a própria albufeira do Alqueva), seja inferior a aproximadamente 40%? Os detalhes podem ser encontrados no texto da Convenção e da sua revisão de abril de 2008.

Como o grau de enchimento destas albufeiras de referência está, com frequência, abaixo do nível mínimo para garantir o citado caudal “ecológico”, verifica-se a possibilidade de haver períodos, mais ou menos prolongados, em que não há qualquer caudal garantido no ponto de entrada do rio Guadiana, em Badajoz, facto que é contraditório com as boas regras ambientais de garantia de um caudal ecológico.

Ou seja, neste novo entendimento, em que se define apenas uma secção do rio Guadiana - a do Pomarão - para definir a sua qualidade da água, não é explícito qual é a proveniência dos caudais que garantem esse requisito, se de Portugal ou se de Espanha e em que percentagens.

Por outro lado, quanto à possibilidade de captação de água do Guadiana no Pomarão foram dados passos importantes de entendimento. Foi finalmente reconhecida a captação de Espanha em Bocachança (que se mantinha em operação não reconhecida por Portugal há mais de 30 anos) de até 60 hm3 anuais e a designada nova captação de “Pomarão”, a construir para o lado português, de até 30 hm3 anuais. O acordo desta Cimeira refere a utilização equitativa de água do Guadiana, pelo que fica por definir a possibilidade futura de Portugal vir a utilizar um volume adicional de mais 30 hm3.

Ficam muitos aspetos por esclarecer, nomeadamente a fixação de caudais diários no Guadiana em vez de mensais, qual a origem dos caudais que permitem o aumento das captações de água no Pomarão sem pôr em causa a qualidade da água e como será concretizada a partilha equitativa da água do rio nessa secção

Em conclusão, pese embora os progressos atingidos nesta Cimeira, ficam muitos aspetos por esclarecer ou melhorar, nomeadamente a fixação de caudais diários no Guadiana em vez de mensais, qual a origem dos caudais que permitem o aumento das captações de água no Pomarão sem pôr em causa a qualidade da água e como será realmente concretizada a partilha equitativa da água do rio nessa secção.

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