Escassez de água e uso eficiente
Moderador: Rodrigo Proença de Oliveira, Professor no Instituto Superior Técnico
Oradores: José Pimenta Machado, Vice-Presidente da Agência Portuguesa do Ambiente (APA); Joaquim Poças Martins, Professor na Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto; Luis Martínez Cortina, Subdirector Adjunto - Subdirección General de Planificación Hidrológica del Ministerio para la Transición Ecológica y el Reto Demográfico.
Escassez de água e uso eficiente: Avaliar medidas tomadas e beber da experiência de outros países
O painel dedicado à escassez de água e ao seu uso eficiente avaliou as medidas que têm vindo a ser tomadas para promover o uso eficiente da água em Portugal e Espanha e debateu possíveis ações adicionais que deveriam ser desenvolvidas no futuro. O painel contou com intervenções de José Pimenta Machado, vice-Presidente da APA, Joaquim Poças Martins, Secretário-Geral do Conselho Nacional da água, e de Luis Martínez Cortina, Subdiretor Geral Adjunto para o planeamento hidrológico na Dirección General del Agua de Espanha. Foi moderado por Rodrigo Proença de Oliveira, do Instituto Superior Técnico.
Todos os oradores realçaram a severidade da seca do último ano, com ilustrações dos seus impactos da seca em vários países da Europa, nomeadamente Portugal, Espanha, França e Itália. José Pimenta Machado referiu que, entre os 10 anos mais secos de sempre, seis ocorreram depois do ano 2000, sendo que o último ano hidrológico foi o terceiro anos mais seco de sempre. O atual ano hidrológico de 2023/24 tem sido particularmente húmido, sobretudo no norte do País, o que tem conduzido a uma recuperação das condições de humidade a norte do Tejo, mas situação de seca persiste, no entanto, no sul do País, e com especial acuidade na bacia hidrográfica do rio Mira, onde a albufeira de Santa Clara se encontra próximo ou abaixo do seu volume morto desde 2019, e no Algarve, onde o volume total das seis albufeiras aí existentes é de apenas 26% da sua capacidade.
A frequência e a severidade das secas dos últimos anos constituem um sério problema para a gestão da água no sul da Europa, mas, mais critico ainda, é o da crescente escassez hídrica, resultante do aumento da procura de água e da diminuição da disponibilidade de água, uma consequência das alterações climáticas.
Para enfrentar este desafio de longo prazo, os diferentes intervenientes defenderam uma abordagem integrada de que contemple várias medidas de natureza estrutural direcionadas, prioritariamente, para o lado da procura de água, mas que também inclua medidas que visem aumentar a oferta de água. As perdas de água significativas que ainda ocorrem nos sistemas de abastecimento de água dos setores urbanos e agrícola justificam a precedência das ações que visem a redução das perdas e o aumento a eficiência do uso da água. Reconheceu-se que a realidade em Portugal é muito diversa, mas os valores médios de perdas de água são muito elevados, da ordem de 25% nas redes em baixa do setor urbano e superior a 35% no setor agrícola. As medidas do lado da procura devem também estender-se ao controlo do consumo, através de ações de sensibilização para um uso racional da água e da utilização de instrumentos económicos para internalização dos custos da água nos processos de decisão. Poças Martins foi particular enfático na necessidade de aumentar o preço da água, afirmando que há capacidade para pagar um pouco mais pela água e dando vários exemplos de preços da água em várias geografias do mundo, nomeadamente de Israel e Califórnia. Pimenta Machado informou que está em discussão no Conselho de Ministros uma reforma da Lei da Água que dará mais capacidade à APA para intervir na gestão da procura, nomeadamente através da tarifa e da definição de dotações de água por utilizador.
No que respeita às medidas do lado da oferta, foram referidas a gestão integrada dos recursos hídricos superficiais e subterrâneos, a utilização de origens alternativas como a reutilização e a dessalinização. Poças Martins chamou à atenção para a necessidade de melhorar a monitorização do uso das águas subterrâneas e de aperfeiçoar a sua gestão conjunta com as águas superficiais, um desafio reconhecido pela APA dado que existem mais de 200 000 registos de captações destas águas nos seus sistemas de informação. Para aumentar a oferta de água poderá ainda ser necessário aumentar a capacidade de armazenamento de barragens existentes, promover a sua interligação ou construir novas, mas essa opção carece de estudos atualizados que tenham em consideração os impactos das alterações climáticas.
Pimenta Machado defendeu que esta abordagem integrada tem vindo a concretizar-se nalgumas regiões do país através de Plano de Regional de Eficiência Hídrica (PREH), como é o caso do Algarve. O PREH Algarve contempla um conjunto de medidas para poupar 7 hm3/ano, dois no setor urbano e cinco no setor agrícola, e aumentar a oferta até, através da reutilização (8 hm3/ano), e da dessalinização (16 hm3/ano), a captação do Pomarão. Referiu ainda os Pactos Regionais para a Água com o Território, descrevendo-os como um novo instrumento para alcançar consensos sobre o modelo de desenvolvimento regional adequado às disponibilidades hídricas e sobre as necessidades de investimento.
Finalmente, Luis Martínez Cortina, partilhou a experiência espanhola na gestão da escassez de água, focando, nomeadamente, a articulação entre o planeamento hidrológico, os planos de gestão de seca e os planos de emergência para assegurar o abastecimento às populações. Questionado durante o debate se os transvases podem ser uma solução para os problemas de escassez no sul de Portugal e de Espanha, Luis Martínez reconheceu que, embora no passado tenham sido construídos vários transvases em Espanha, atualmente não existem condições politicas para prosseguir com esta opção que considerou não ser de futuro.