LNEG obrigado a aceitar as certificações dos biocombustíveis reconhecidas pela UE

LNEG obrigado a aceitar as certificações dos biocombustíveis reconhecidas pela UE

Recentemente, notícias vieram a público sobre possível fraude na origem de biocombustíveis usados na Europa e em Portugal. A Associação ZERO veio mesmo sublinhar que, apesar de Portugal ter assumido o compromisso de abandonar o uso de biocombustíveis à base de óleo de palma, inscrito na Lei de Bases do Clima e no Orçamento do Estado para 2022, a medida nunca saiu do papel. Por outro lado, os produtores nacionais de biocombustíveis, através das suas organizações, Associação Portuguesa de Produtores de Biocombustíveis (APPB) e Associação Bioenergia Avançada (ABA), referem mesmo que as autoridades nacionais não controlam as possíveis fraudes na origem, em particular as matérias-primas que chegam à Europa que são resíduos da indústria de palma, caso do efluente de éster metílico de óleo de palma (POME) e dos cachos vazios de frutos de palma. E alegam que existe uma diferenciação de tratamento entre produtores nacionais/europeus e terceiros (fora da UE), com um escrutínio mais apertado aos produtores nacionais. Em súmula, todos pedem uma atuação urgente do Estado português. Entre as medidas propostas, estão a revisão do modelo europeu de certificação, passando o controlo para entidades públicas, a criação de um sistema transparente de rastreabilidade e informação ao consumidor, bem como o reforço do combate à fraude através de uma estrutura europeia dedicada. Acresce que estas queixas das empresas não ocorrem apenas em Portugal, sendo agora o momento para nos debruçarmos com factos sobre a realidade atual. Relativamente a eventuais fraudes nos biocombustíveis, alguns países europeus — casos da Bélgica, Holanda e Irlanda ­­— fizeram chegar ao Conselho Europeu alegações de fraudes com biocombustíveis provenientes da Ásia, que, até ao momento, não foram consubstanciadas por estes países nem comprovadas. Apenas a Alemanha apresentou na Comissão Europeia (CE), em 2023, uma queixa formal sobre fraude na importação de biodiesel da China. Após mais de um ano e meio de investigações pela CE, esta acabou de encerrar o caso, informando que não foi possível comprovar evidências de fraude, embora admita que identificou fraquezas na legislação europeia de confirmação da sustentabilidade dos biocombustíveis, principalmente nas matérias residuais produzidas na origem, e anunciou medidas de curto e médio prazo para tornar o sistema europeu mais robusto à fraude.

Em Portugal, a entidade que supervisiona o sistema de certificação na produção ou importação de biocombustíveis é o Laboratório Nacional de Energia e Geologia, através da Entidade Coordenadora do Cumprimento dos Critérios de Sustentabilidade (LNEG/ECS). O LNEG/ECS atua apenas a montante na cadeia de valor, estabelecendo e verificando a aplicação da Diretiva 2018/2001 (RED II) desde a matéria-prima utilizada até à produção ou importação do biocombustível. Decorrente desse trabalho, o LNEG/ECS informa mensalmente a ENSE E.P.E., para cada operador económico, sobre quais os lotes de biocombustíveis classificados como sustentáveis e se tem direito a um Título de Biocombustível (TdB) simples ou duplo.

À ENSE cabe o papel de atuar a jusante da cadeia de valor, fiscalizando a introdução no mercado dos biocombustíveis produzidos ou importados, emitir e cancelar TdB e realizar ações de fiscalização junto dos operadores económicos (OE).

À ENSE cabe o papel de atuar a jusante da cadeia de valor, fiscalizando a introdução no mercado dos biocombustíveis produzidos ou importados, emitir e cancelar TdB e realizar ações de fiscalização junto dos operadores económicos (OE). Relativamente ao modelo europeu em vigor de certificação dos biocombustíveis, baseia-se em regimes voluntários internacionais (RV) que auditam os OE que intervêm em todos os elos da cadeia de valor, sendo o LNEG/ECS obrigado a aceitar como válida a informação apresentada nas Provas de Sustentabilidade (PoS) emitidas no âmbito de certificação por RV reconhecido pela Comissão Europeia. Sempre que surgem dúvidas, a ECS poderá solicitar esclarecimentos ao RV, que tem por obrigação realizar auditorias ao OE através dos Organismos de Certificação (OC) que subcontrata. E se as dúvidas residirem em território nacional, poderá ocorrer uma ação de fiscalização por parte da ENSE. Este tipo de ação é, em geral, possível apenas no território nacional, dado que qualquer ação de fiscalização fora da UE carece de autorização do governo do país onde ocorrerá a fiscalização, sendo que países como a China dificilmente concedem essas autorizações. Desde a entrada em vigor da RED II através do DL 84/2022, a ECS, em parceria com a ENSE e DGEG, passou a realizar supervisão do trabalho dos OC contratadas pelos RV, junto dos OE nacionais. Quanto a países terceiros, encontra-se a decorrer um processo de alteração legislativa ao Regulamento de Execução (UE) 2022/996 que irá criar condições para que essa supervisão possa ser realizada também sobre os OE da cadeia de produção dos bicombustíveis fora do território do Estado-Membro que os recebe e consome.

(...) encontra-se a decorrer um processo de alteração legislativa a nível europeu que irá criar condições para que a supervisão dos biocombustíveis possa ser realizada fora do território do Estado-Membro que os recebe e consome.

A própria Ministra do Ambiente e Energia, Maria da Graça Carvalho, na Assembleia da República, em janeiro passado, afirmou, e bem, que “…não é possível fiscalizar para além da confiança nos países que nos enviam os certificados, quando eles próprios já fizeram a verificação das declarações”. De facto, todos os OE com registo na ECS têm certificação por RV reconhecido pela Comissão Europeia, com exceção daqueles que não emitem provas de sustentabilidade. Sendo que a unidade de produção do biocombustível é a que fecha o ciclo, emitindo a última PoS do sistema, após adicionar à mesma a emissão de GEE devida pela distribuição final do biocombustível. No caso de um importador, este recebe a PoS final de um fornecedor. O que é necessário garantir é que a empresa que fornece o importador se encontre devidamente certificada. Pela Diretiva RED II, para que possa ser emitida uma PoS a um lote de biocombustível, toda a cadeia deverá estar certificada, garantindo, deste modo, a rastreabilidade.

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