Não estamos a melhorar o nosso ambiente

Não estamos a melhorar o nosso ambiente

Portugal precisa de pensar (e sentir) o Ambiente como uma oportunidade para melhorar e não como um entrave ao desenvolvimento. A capacidade técnico-científica atual deve proporcionar soluções inovadoras e sustentáveis, em que o desenvolvimento socioeconómico ocorra harmoniosamente com a proteção e o usufruto do ambiente. A Pessoa deve ter um papel fundamental nesta transição, sendo simultaneamente um motor e um beneficiário duma sociedade resiliente, baseada na circularidade da economia.

A compreensão e a ação na área do ambiente são intrinsecamente holísticas, sendo necessário analisar vários aspetos ambientais, per si, e também assimilar as diferentes interações que existem entre esses aspetos. Os desafios setoriais refletem a relevância do uso sustentável dos recursos naturais — água, ar, energia e biodiversidade —, bem como a gestão inteligente dos resíduos. Todavia, é difícil continuar a pensar o ambiente sem ter em consideração as suas características sistémicas.

O impacto das alterações climáticas em Portugal é inquestionável e, além de medidas de mitigação das emissões de gases com efeito de estufa e dos compromissos assumidos por Portugal, importa agora evoluir rapidamente com políticas de adaptação.

A transição para a economia circular, que exige uma nova (ou talvez não tão nova!) maneira de pensar e agir, tem de avançar, com a implementação de políticas claras e concretas.

Enquanto o cidadão não estiver consciente dos custos para a sua saúde, e também para a economia, dos efeitos da degradação do ambiente, não assumirá completamente os desafios ambientais que enfrenta. O binómio Ambiente-Saúde tem de voltar à agenda nacional, com a relevância que merece.

Uma política ambiental equilibrada é, antes de mais, a expressão do Direito fundamental ao Ambiente, tal como consagrado na Constituição da República Portuguesa, e da Lei de Bases do Ambiente.

É um aspeto central na qualidade de vida das pessoas. Uma oportunidade de fomento para uma economia verde, geradora de emprego e de riqueza para o País. Um ato de responsabilidade para as gerações futuras. Uma necessidade face aos desafios que a Humanidade enfrenta.

Os três vetores da sustentabilidade — ambiental, económica e social — merecem igual importância. De nada vale uma sociedade altamente preocupada com a redução da sua pegada ecológica se a solução passar por retroceder na qualidade de vida das pessoas. Mas, de igual modo, de nada vale uma sociedade altamente evoluída tecnologicamente se deixarmos para as gerações futuras um passivo ambiental irrecuperável.

No centro destes vetores encontra-se a Pessoa. Os reptos que se colocam nesta matéria são inultrapassáveis se as pessoas não estiverem comprometidas e entusiasmadas. Para esse efeito, é necessário que o Estado emane a regulamentação necessária para que o Cidadão seja o ponto focal, como motor e beneficiário, na resposta aos imensos desafios que se avizinham em matérias tão distintas como a valorização das nossas riquezas naturais, a transição para um novo paradigma energético, a digitalização, a mobilidade suave, a economia circular, a emergente suficiência e racionalização na utilização dos recursos e a adaptação às alterações climáticas.

O Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), que poderia ser uma grande oportunidade para o País neste setor, está a desiludir, não só pelo seu atual baixo nível de execução, mas sobretudo pela falta de estratégia, coragem e ambição. Em matéria de Ambiente e Energia, a qualidade é mesmo fraca. O documento desilude no tocante ao Climate Investments and Reforms da União Europeia em vários pilares. Na Energia, descurou a digitalização das redes. Por outro lado, há pouca ambição no tema eficiência e suficiência energética, tanto no alcance como na verba alocada. Na Água, o PRR não tem uma visão integrada do setor. A gestão hídrica é um parente pobre. Zero para a eficiência hídrica. Adicionalmente, não se investe na distribuição de água em áreas com menor densidade populacional. Nas Alterações Climáticas, temos um desequilíbrio entre Mitigação e Adaptação. O combate à erosão costeira não existe no PRR! Nos Resíduos, o ponto de partida é péssimo e, neste particular, não basta recuperar — o país terá de se superar. Nesse sentido, é confrangedor ver que o PRR não propõe uma ação macro sobre a gestão dos resíduos. A Economia Circular é apenas um soundbite. Nem ao próprio Estado, que recebe a maior parte das verbas previstas no PRR, se impõem as regras de circularidade com estratégias de compras públicas ecológicas.

Os nossos governantes, neste setor, não possuem competências técnico-científicas na área. Não conhecem o estado da arte das principais tecnologias. Desconhecem que uma solução técnica inovadora tem previamente de ultrapassar inúmeras etapas num demorado processo de testagem e incremento de escala. Basta-lhes um bom plano de negócios onde no Excel ou no PowerPoint tudo cabe! Só assim se explica a megalomania dos 10 GW de Eólico OffShore num único leilão, ou o megaprojecto do Hidrogénio em Sines, quando ainda não existem soluções técnicas disponíveis para essa dimensão.

Enfim, estamos claramente a perder uma enorme oportunidade para Melhorar o nosso Ambiente.

 

Texto publicado na edição julho/agosto 2023 do Jornal Água&Ambiente

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