Regulamento Ecodesign para Produtos Sustentáveis aponta o caminho para uma economia mais circular
A legislação europeia inclui várias disposições que visam promover uma abordagem à gestão de resíduos que vá para além da reciclagem. Por exemplo, a Diretiva-Quadro dos Resíduos obriga a Comissão (artº 9º) a desenvolver um plano de ação, a nível Europeu, com medidas destinadas a alterar os atuais padrões de consumo e os Estados-Membros (artº 29º) a desenvolverem programas de prevenção de resíduos. A reciclagem é importante, mas não é a forma mais eficiente de promover uma economia mais circular.
A reciclagem apenas limita os impactos do modelo linear. Daí que a reciclagem ocupe o terceiro lugar na hierarquia de gestão de resíduos.
No entanto, a prevenção da produção de resíduos e instrumentos que ajudam a manter o valor dos produtos na economia como a reparação, o recondicionamento a reutilização e a remanufactura, para além de enfrentarem barreiras regulamentares e psicológicas por parte dos consumidores, não têm recebido a atenção e os incentivos que deveriam, tendo em conta o respetivo lugar na hierarquia de gestão de resíduos.
Nos dois planos de ação da União Europeia para a economia circular (2015, 2020) e no Green Deal (2019) existe uma maior aposta numa nova geração de instrumentos legislativos que procuram promover níveis mais elevados da hierarquia de resíduos.
O Regulamento sobre Ecodesign dos produtos sustentáveis é a chamada “flagship” do segundo Plano de Ação para a economia circular. Visa substituir a Diretiva Ecodesign de 2009 cujo foco principal era a eficiência energética dos produtos.
A proposta foi apresentada, pela Comissão, em março de 2022, e as instituições europeias chegaram a acordo sobre o texto final em dezembro de 2023.
Esta iniciativa vai estabelecer um conjunto de princípios para a sustentabilidade dos produtos, combater a obsolescência prematura e promover maior durabilidade, eficiência e manutenção dos produtos através do reuso, remanufactura, reparação, upgrade e maior reciclagem e incorporação de materiais reciclados.
O regulamento irá estabelecer requisitos de desempenho e de informação para quase todas as categorias de bens físicos colocados no mercado da UE (com algumas exceções, como os géneros alimentícios e os alimentos para animais, conforme definidos no Regulamento CE/178/2002).
Os requisitos poderão ser relativos a:
• durabilidade, fiabilidade, reutilização, capacidade de atualização e reparação do produto;
• presença de substâncias perigosas e que inibam a circularidade;
• eficiência energética e de recursos;
• conteúdo reciclado;
• geração prevista de resíduos;
• remanufatura e reciclagem;
• pegadas de carbono e ambientais;
• requisitos de informação, incluindo um Passaporte Digital de Produto.
O novo “Passaporte Digital de Produto”, incluído neste regulamento, fornecerá informações sobre a sustentabilidade ambiental dos produtos. Deverá ajudar os consumidores e as empresas a fazerem escolhas informadas quando adquirem produtos, facilitar as reparações e a reciclagem e melhorar a transparência sobre os impactos do ciclo de vida dos produtos no ambiente. O passaporte do produto deverá também ajudar as autoridades públicas a realizar melhor as verificações e os controlos.
Com o passaporte do produto bastará fazer o scan na embalagem para aceder a informação sobre os impactes ambientais do produto, durabilidade, reparabilidade, conteúdo reciclado ou a disponibilidade de peças sobressalentes.
De acordo com o Estudo de Impacte da proposta, em 2030, este regulamento pode conduzir a 132 mtep de poupança de energia primária, o que corresponde aproximadamente a 150 mil milhões de metros cúbicos de gás natural, quase equivalente à importação de gás russo pela UE.
Esta iniciativa irá também incentivar novos modelos de negócio circulares como a partilha ou a venda do serviço em vez da propriedade de um bem. No entanto, a mera publicação do regulamento não termina o processo de implementação. A Comissão, terá de publicar um plano de trabalho com a listagem dos produtos com maior impacte ambiental e, através de atos delegados, estabelecer, para cada grupo específico de produtos, requisitos de ecodesign de modo a que estes se tornem mais sustentáveis.
Estes atos delegados irão definir os investimentos que os agentes económicos terão de efetuar para se adaptarem a este regulamento. Serão também a principal referência para a modelação das taxas relativas à responsabilidade alargada do produtor previstas na revisão de 2018 da Diretiva-Quadro dos Resíduos.