
Sobre a Conferência da Água das Nações Unidas
A Conferência da Água das Nações Unidas, que se realizou de 22 a 24 de março de 2023, teve como principal objetivo acelerar a implementação do ODS 6 sobre Água e Saneamento e, através dele, de toda a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável.
Há muito trabalho pela frente: uma em cada quatro pessoas no mundo vivem sem acesso seguro a água potável; quase três em cada quatro desastres naturais estão relacionados com a água; e mais de 1,7 mil milhões de pessoas não têm acesso a saneamento básico. Foi face a este cenário que os 193 Estados-membros das Nações Unidas se reuniram, para trocar experiências, desafios e lições aprendidas.
Só com cooperação internacional conseguiremos encontrar soluções que nos ajudem a tornar os Direitos Humanos à Água e ao Saneamento uma realidade em todas as latitudes, que permitam proteger o recurso precioso que é a água, que aumentem a resiliência num contexto marcado pelas alterações climáticas, e que promovam uma gestão mais integrada dos recursos hídricos. Foi por isso que os Estados-membros, mas também entidades do setor privado, da sociedade civil, do setor financeiro, da regulação e da academia se juntaram para propor diversos compromissos voluntários neste âmbito, que serão coligidos na “Agenda de Ação para a Água”, e que constituirão um importante resultado desta Conferência, para ser implementado ao longo dos próximos anos.
A participação de Portugal na Conferência da Água das Nações Unidas partiu da sua experiência e das lições aprendidas no caminho que o País tem vindo a prosseguir nos últimos anos, que permitiu que, chegados a 2023, atingíssemos níveis máximos de qualidade de água para consumo humano (muito próximos de 100%), quando, há trinta anos, eram de 50%, ou com taxas de cobertura através de redes de saneamento a rondar os 85%, quando eram de 28% há trinta anos – com reflexo na qualidade das águas balneares ou na melhoria das condições de saúde.
A importância e o impacto deste caminho para o desenvolvimento sustentável e para a saúde dos oceanos foi tema central no Simpósio de Alto Nível que Portugal organizou durante a Conferência dos Oceanos das Nações Unidas (em Lisboa, em 2022), cujas conclusões e recomendações foram recordadas em Nova Iorque, durante os dias 22 e 24 de março, na segunda Conferência da Água das Nações Unidas (depois de 46 anos de interregno), em especial a urgência de uma abordagem única para a água, ou seja, uma visão holística para a água, unindo as comunidades de água doce e salgada.
Portugal levou à Conferência da Água das Nações Unidas a sua visão para a água, e as respostas que têm vindo a ser dadas aos desafios que nos colocam as alterações climáticas, que impactam hoje, de forma direta e muito expressiva, os recursos hídricos. Um visão marcada pela aposta na redução do consumo e no uso eficiente da água, poupando-a e preservando-a nas suas fontes e por devolvê-la em bom estado aos rios e ao mar; pela reutilização de agua tratada para fins compatíveis, como seja na rega de culturas permanentes, no golfe, ou na limpeza urbana, aplicando claramente os princípios da economia circular; por aumentar a resiliência e redundância da origens de agua existentes, otimizando a exploração dos sistemas de abastecimento e complementarmente quando necessário pela dessalinização. Tudo isto tem de ser efetuado num quadro de sensibilização para os cenários de escassez hídrica e partilha de informação, de conhecimento, de inovação e tecnologia, e pela cooperação no domínio da água. O problema convoca-nos a todos.
No plano internacional, na conferência ficou bem marcada pela necessidade de melhoraria da coordenação e da coerência do trabalho no seio das Nações Unidas em matéria de água, em especial pela instituição do Enviado Especial para a Água, que poderá ajudar a dar à água a voz que lhe falta, assim como, pela necessidade de cooperação e articulação e gestão conjunta nas bacias hidrográficas transfronteiriças.
A cooperação internacional como um instrumento essencial para a gestão integrada dos recursos hídricos continuará a ser um dos principais compromissos de Portugal em matéria de água, seja ao plano transfronteiriço – bem sublinhado pelo Secretário-Geral das Nações Unidas, António Guterres, ao referir-se ao trabalho desenvolvido por Portugal e Espanha na gestão partilhada das bacias hidrográficas ibéricas a coberto da Convenção de Albufeira que os dois Países assinaram há 25 anos –, seja no plano bilateral, junto dos nossos parceiros privilegiados de cooperação (de que são exemplo a resposta rápida aos efeitos causados pela seca severa e pelas posteriores inundações que têm assolado Moçambique ou o apoio a projetos de infraestruturas de saneamento em Cabo Verde).
À margem da Conferência, e no quadro da mesma, Portugal reforçou e estabeleceu novos laços de cooperação com a Ucrânia, a Tunísia Cabo Verde e a China.
Um dos compromissos concretos com a Agenda de Ação para a Água que Portugal levou à Conferência da Água das Nações Unidas foi a iniciativa para uma Coligação Global para Melhores Políticas e Regulação dos Serviços de Água e Saneamento liderada pela LIS-Water [1], como uma plataforma de cooperação internacional destinada a impulsionar a melhoria das políticas públicas e a regulação dos serviços de água e saneamento no mundo, contribuindo para apoiar a implementação de políticas públicas sólidas, fortalecer estruturas e instituições regulatórias e, consequentemente, a alcançar mudanças significativas no setor.
A iniciativa conta já com uma extensa rede de parcerias, envolvendo 42 reguladores destes serviços em 19 países da América Latina e Caraíbas, além de Portugal. Estão ainda envolvidas no projeto várias entidades internacionais, como a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), a Organização Mundial da Saúde (OMS), a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), o Fundo da Organização das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), a Sanitation and Water Association for All (SWA), a International Water Association (IWA), a Economic Commission for Latin America and the Caribbean (CEPAL) e o Stockholm International Water Institute (SIWI).
[1] centro internacional sem fins lucrativos dedicado às políticas públicas, à regulação e à gestão dos serviços de águas – abastecimento de água e gestão de águas residuais e pluviais