Substituição não equivale a sustentabilidade

Substituição não equivale a sustentabilidade

Recentemente foi anunciado o aumento da capacidade de fabrico de embalagens descartáveis de papel/celulose em Portugal, tendo tal sido apresentado como um passo rumo à sustentabilidade do setor da embalagem. O facto que é frequentemente esquecido nestas análises relativas à substituição de materiais (do plástico para o papel ou materiais afins) é que a substituição de materiais não equivale necessariamente a maior sustentabilidade.

O que se sabe é que entre 2013 e 2020 a quantidade de resíduos de embalagem aumentou 15% em todo o espaço da UE. E embora se fale muito sobre o plástico, o facto é que o aumento tem acontecido em diferentes materiais de embalagem. Por exemplo, as embalagens de papel e cartão já são o principal resíduo de embalagem e no espaço de 8 anos (entre 2012 e 2020) o seu consumo per capita aumentou em 10kg. Aliás, na UE cerca de metade do papel já é usado para embalagens, o mesmo acontecendo com cerca de 40% do plástico. 

Pensar que conseguimos resolver o problema das embalagens descartáveis substituindo materiais sem alterar o modelo de produção e consumo, é ignorar a sua inerente insustentabilidade

Pensar que conseguimos resolver o problema das embalagens descartáveis substituindo materiais sem alterar o modelo de produção e consumo, é ignorar a sua inerente insustentabilidade. A quantidade de material que o sistema de produção de embalagens descartáveis exige é de tal ordem, que uma simples substituição resultará numa transferência de impactos e não na sua diminuição significativa. Mesmo quando se trata de materiais de origem renovável, existem limites para a sua exploração sustentável.

A pressão que o setor florestal já está a sentir em várias partes do mundo, incluindo em países onde a floresta certificada é um cartão de visita, ilustram muito bem o que a manutenção do sistema de embalagens descartáveis, ainda que assente noutras fontes que não o plástico fóssil, como o papel/cartão, representa em termos da promoção de práticas insustentáveis. Existem limites para a certificação florestal e continuar a fomentar a monocultura de espécies como o eucalipto, não pode ser considerado sustentável. Aliás, Portugal é um excelente exemplo das consequências negativas das monoculturas.

A par dos impactos na floresta e na paisagem, as limitações de materiais como o papel/celulose, nomeadamente a necessidade de muitas vezes terem de ser conjugados com outros materiais (por exemplo, o plástico ou substâncias químicas) para garantir características como a impermeabilidade ou estanquicidade também não podem ser ignoradas. Por exemplo, muitas vezes são usados PFAS (os atualmente designados químicos eternos) para garantir a impermeabilidade de embalagens de papel e de outras fibras naturais, o que representa um risco para a saúde humana, mas também para o ambiente se, por exemplo, essas embalagens acabarem encaminhadas para o tratamento de biorresíduos, o que resultará na presença de PFAS no composto daí resultante.

Este facto, associado aos usos para que se destinam (por exemplo, para embalagens alimentares que acabam por te ruma elevada carga de resíduo orgânico após a sua utilização), dificultam a sua reciclagem no fim da sua vida (mesmo que sejam potencialmente recicláveis), levando a que o seu fim mais comum acabe ainda por ser o aterro ou a incineração.

(...) é tempo de reconhecermos a insustentabilidade do modelo de produção e consumo de embalagens descartáveis e começarmos a trabalhar para reduzir a quantidade de embalagens necessárias no sistema (...)

Portanto, é tempo de reconhecermos a insustentabilidade do modelo de produção e consumo de embalagens descartáveis e começarmos a trabalhar para reduzir a quantidade de embalagens necessárias no sistema, apostando de forma clara na redução da quantidade de embalagem e na promoção de embalagens reutilizáveis no âmbito de sistemas de reutilização, de forma a maximizar os ganhos ambientais.

Felizmente o Regulamento Europeu sobre Embalagens e Resíduos de Embalagem aponta nesse sentido, ainda que com imensas lacunas, em grande parte resultado do lóbi feito pelas empresas que querem manter o seu modelo de negócio assente nas soluções descartáveis. Ainda assim, existem objetivos de redução e de reutilização que exigirão ação por parte dos países e que, se bem pensada, poderá representar o início da transição para modelos mais sustentáveis na área das embalagens.

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